terça-feira, 6 de novembro de 2007

A VALE É DO POVO, MAS SEU LUCRO É DOS BANCOS.



João Pedro Stedile

Durante a Semana da Pátria, cerca de 100.000 voluntários de centenas organizações, movimentos sociais, pastorais, Grito dos Excluídos, Sindicatos da CUT, da Intersindical, da Conlutas e anônimos militantes realizaram enorme mutirão, em quase 4.000 municípios.

O que fizeram? Fizeram um impressionante exercício de pedagogia popular, levando para milhões de brasileiros o debate sobre a anulação do leilão que privatizou a empresa Vale do Rio Doce, a continuidade do pagamento dos juros da dívida interna, a provável reforma e perda dos direitos previdenciários e as absurdas tarifas de energia elétrica.

O resultado foi um sucesso! Sem contar com nenhum meio de comunicação de massa e atacados pelos meios das classes dominantes, os movimentos socias deram uma demonstração de capacidade organizativa e levaram sua mensagem a milhões de brasileiros, que debateram temas que a mídia e o governo querem ignorar.

O resultado também demonstrou a consciência do povo. Mais de 97 por cento de 3 milhões de brasileiros votaram pela reestatização.

E têm muita razão. Primeiro porque a empresa foi roubada. Valia 100 bilhões e foi vendida por 3. Segundo, o leio foi fraudulento e manipulado, basta dizer que a mesma empresa gringa que fez a avaliação do patrimônio assessorou o Bradesco na compra. Foi tão vergonhoso, que correm na justiça a dez anos, mais de 80 processos por sua anulação. Em um deles, em dezembro de 2005, o Tribunal Federal de Brasília julgou pela anulação. Cadê os ilustres governantes que dizem, na hora das greves, “senteça não se discute, se cumpre!”?

Terceiro: a Vale era fruto de investimentos do Orçamento da União e detém um patrimônio que é de todos os brasileiros, nas jazidas de minério, nos 700.000 hectares de terras públicas que controla, nas estradas de ferro e portos construídos com dinheiro de todos.

O lucro e a pancadaria

Sabendo que não tem razão, a Vale tem que apelar. Gastou milhões de reais com uma campanha publicitária na televisão, com apoio de artistas lúmpens-globais. Teve que aumentar a distribuição de migalhas, financiando centenas de projetos de entidades socias e igrejas. Total gasto:320 milhões de reais em projetos sociais. Valor do seu lucro líquido: 14 bilhões de reais, que foram para seus acionistas, sendo que 60 por cento deles moram no exterior.

Convocou seus “meninos de ouro”, parlamentares de todos os partidos, que tiveram suas campanhas financiadas por ela, desde ilustres senadores petistas até ministros e prefeitos, para atacar a campanha pela reestatização. Até o presidente Lula se esqueceu rápido do que disse no segundo turno, em outubro do ano passado, que a privatização da Vale tinha sido um erro.

Pior, em Minas Gerais, a Vale mostrou toda sua sanha e reprimiu violentamente uma manifestação de jovens que protestavam diante de seu escritório. O chefe de segurança era um coronel aposentado, famoso desde os tempos da ditadura.

O retorno da Vale para o controle e benefício de todo povo vai demorar. Exigirá mais mobilizações, mais consciência e organização, mas o plebiscito demonstrou que esse povo está disposto a brigar pela retomada da empresa. E algum dia ela retornará a quem de direito.

João Pedro Stedile é membro da Coordenação Nacional do MST e da Via Campesina.

Fonte: Caros Amigos, ano XI número 127 outubro 2007.
Posted on by Residência do Estudante de Guanambi | No comments

0 comentários: